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"A morte de Ivan Ilitch" | Uma reflexão sobre o fim da vida

Orquídea Polónia

Sabem aquele livro que é tão fininho e que nós sabemos que nos vai acrescentar algo?

Tive essa sensação com "O ano da morte de Ivan Ilitch", de Lev Tolstoi.

É um livro pequeno que se lê relativamente rápido, sendo a minha última leitura no ano de 2019. Vamos lá à opinião!




Este clássico tem a sua localização na Rússia, em pleno século XIX. O livro conta-nos a história de Ivan Ilitch, um juiz cuja vida chegou ao fim. Começa mesmo pela sua morte, na perspetiva de uns colegas, adiantando-se com a descrição da sua vida e, no fim, da sua morte. Mas, como não há vida sem morte nem morte sem vida, estas duas coisas estão ligadas. A falecer por motivo de doença, Ivan começa a repensar na sua vida, custando-lhe admitir a verdade: viveu-a mal.


Para um livro tão pequeno, é interessante a reflexão pertinente e profunda que é feita pelo autor.

Ivan é um homem pacato, que pretende apenas alcançar a sua ideia de felicidade: trabalho, família e diversão com amigos. É ambicioso e grande parte do seu tempo procura um emprego melhor, com salário melhor, de forma a conseguir melhores luxos. Escolhe a sua esposa por ser um momento adequado, aquilo que a sociedade espera de si. No entanto, é boa pessoa. Vai vivendo a vida.


Quando adoece, não toma a doença como algo sério. Depois, quando a mesma persiste e se torna intolerável, vem o receio de que seja grave. Será que sobrevive? A mesma questão é feita de modo silencioso pelos familiares - esposa e filhos.

Começamos, assim, uma viagem pela morte.




A maior parte de nós já lidou com a morte e, provavelmente, até já fez ou faz um processo de luto. A morte é rápida, fria e crua como o autor a descreve. A escrita reflete esplendidamente o quão confuso e individual pode ser o processo de perda.

No entanto, nunca nenhum de nós o viveu desta maneira - na primeira pessoa. É incrível o esforço que o autor faz para nos guiar nos pensamentos e sentimentos de alguém que já está condenado. Primeiro, a esperança. Depois, o medo. A seguir a solidão e a injustiça. Por fim, as incertezas e as verdades (por contraditório que possa parecer).


Sempre me quis parecer que as pessoas, quando estão a morrer, ganham uma espécie de inteligência fora do comum, como se soubessem coisas que antes não sabiam, coisas que o comum dos mortais ainda não sabe. Algo quase sobrenatural. Este livro reforça essa ideia, mas faz-me compreender que a explicação é bastante simples e realista: as pessoas têm mais tempo. Quando o nosso tempo se esgota, temos todo o tempo do mundo, sobretudo se estamos de cama, doentes. Se vamos morrer, podemos parar para pensar, e não pensaremos noutra coisa se não na nossa morte e, por isso, na nossa vida. Analisamos tudo com detalhe e chegamos a conclusões corajosas.


Ivan Ilitch encontrou a sua paz quando chegou à conclusão que tinha vivido mal a sua vida. Afinal, focar-se no trabalho, a sua única felicidade, e ir de encontro às pretensões da sociedade não lhe deram sossego nos últimos dias de vida. Restou-lhe a solidão, já que os seres humanos têm sempre uma perspetiva egoísta daquilo que os rodeia. Para Ivan, a sua morte era o fim de tudo, eram dores horrendas e falta de capacidade e mesmo dignidade. Para os outros, era o sentimento de pena, era uma promoção no trabalho pois o seu cargo estava vago, era o trabalho de ir a um funeral, era ter que lidar com a sua doença, era uma pensão, era um estorvo. Nunca ninguém compreendeu o que ele sentia, muito menos o tratou de forma despretensiosa, como se a morte fosse sua e não deles.

Há algo de brilhante e de cruelmente real nesta premissa defendida por Lev Tolstoi.


Tudo isto para concluir que esta leitura é fascinante. Sendo um livro normalmente rápido (tem um começo um pouco maçador), fácil de ler e cativante, acaba por nos acrescentar muito em reflexões.

Por ser direto e pequeno, fica-se sempre com a sensação de que deveria haver mais e de que a morte é ainda mais do que isto.

E vocês, gostaram?

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