As Intermitências da Morte | Uma reflexão com a morte como personagem
- Orquídea Polónia
- 31 de mar. de 2018
- 2 min de leitura
Saramago é um dos autores portugueses que mais aprecio. Desta vez, tive oportunidade de ler "As Intermitências da Morte", um livro que já há algum tempo me deixa curiosa. Aqui fica a minha opinião!
"No dia seguinte ninguém morreu." Assim começa o livro, que conta a história da morte que, num dado país, deixa de matar. Sim, às doze badaladas do dia um de Janeiro todos deixam de morrer dentro daquela fronteiras.Se parece muito positivo uma perspetiva de vida eterna, há para tudo um lado negativo. Os enfermos que, às portas da morte, continuam moribundos sem uma hipótese de ver finalizada a sua dor. Depois, temos o envelhecimento da população, que começa a preocupar o Estado - como se pagarão pensão a tantos idosos, com tão poucas pessoas ativas para compensar? Temos ainda a versão da Igreja, que vê abalada as crenças que defende.
Esta é uma primeira parte da história, a mais carregada de reflexão e de sátira à sociedade. Na verdade, é com estes reparos que Saramago nos abre os olhos para o facto de que a morte, carregada de tanta negatividade, faz parte da vida, sendo essencial para o bom funcionamento do mundo. E depois, que alívio tem que está a morrer, se não pode ter saúde eterna?
Gostaria de ver esta mais explorada, já que permite uma maior reflexão sobre a condição humana, algo que eu penso ser excecional na escrita de Saramago. O modo como o autor explora estes temas com uma ironia falsamente inocente faz com que uma pessoa se mantenha interessada, por muito que não tenha uma escrita fácil.
Já uma segunda parte do livro foca mais a morte em si. Sim, a morte e não a Morte, porque mortes há muitas. A morte surge agora como uma personagem. Retomando a sua atividade, está na hora de voltar a matar as pessoas quando chega a sua vez. Desta vez, com uma diferença. Decidiu dar a oportunidade às pessoas de se despedirem e tratarem do necessário, dando-lhes a notícia com uma semana de antecedência. Tudo se dificulta quando ela não consegue fazer chegar a mensagem a um violoncelista, não tendo forma de cumprir a sua morte. Assim, investiga o homem, acabando por se meter numa encruzilhada. Saramago consegue, desta forma, humanizar uma personagem tão inumana como a morte, tornando a figura mítica e fria numa mulher com sentimentos.
Acabei por ter torcido um pouco o nariz ao romance que depois se foi criando no final, queria mais das reflexões iniciais. Ou será que o autor tentava dizer que o amor até a morte vence?
No entanto, foi um bom livro para ler, além de que Saramago é sempre uma ótima opção!
Quem já leu o livro e o que achou?
"Isso a que chama mistérios é muitas vezes uma proteção, há os que levam armaduras, há os que levas mistérios"
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